“Já fazes parte da nossa história e ainda nem te temos nos braços.”. Aconselhamos a leitura de cada frase deste artigo pois irá ficar a saber o que a espera na consulta pré-natal do 1º trimestre de gravidez.
A gravidez é um período de grandes mudanças, tanto físicas quanto emocionais… um momento único na vida de uma mulher. É percebido como um evento que marca a passagem da mulher para a maternidade e pode ter significado na sua vida social e profissional. É certo que ter um filho dá-nos um sentido de propósito e significado à vida. Induz sentimentos de satisfação, gratidão, realização e sensação de bem-estar. Num paradoxo de sentimentos surge o aumento da responsabilidade, sentimentos de sobrecarga e a necessidade de superar os nossos próprios limites. Este período pode ser uma fonte medo, incerteza e stress, mas também de grande crescimento pessoal e de autodescoberta.
Apesar de abordarmos o tema com maior predominância dos aspetos maternos, ambos sabemos que o pai tem o seu próprio processo de mudanças e que este também deve ser respeitado. Verá que não nos esquecemos deste protagonista da História de Maternidade.
A neurociência tem dedicado o seu aprendizado a este período de vida da mulher, considerando-o, como sendo um período fortemente responsável por mudanças estruturais e funcionais do seu cérebro. Por exemplo, estudos verificaram que as mulheres grávidas têm maior sensibilidade às crianças do que as não grávidas, e que a amígdala (uma área do cérebro reativada na regulação das emoções) se desenvolve durante a gravidez para melhorar a capacidade de reconhecimento e conexão da mãe com o bebé – vinculação. A produção de hormonas, como a progesterona e o estrogénio, desempenham um papel fundamental no processo de vinculação e auxiliam a mulher na sua auto-regulação perante momentos de stress.
Expectativas vs Realidade
Temos as nossas expectativas, ideais parentais, projetos e perspetivas de perfeição, fundamentados nas nossas próprias crenças e valores que repercutem padrões de uma vida. No entanto, há toda uma vivência que se impõe entre o que se idealiza e a realidade que enfrentamos.
A sociedade também tem expectativas diferentes sobre como nos devemos comportar durante a gravidez e como devemos cuidar dos nossos filhos. Como desejamos ser perfeitas, receber a validação do mundo como tal e ainda ambicionamos sentir-nos realizadas a nível pessoal, profissional e social, acabamos por sentir-nos fracassadas e frustradas.
Segundo o pediatra e psicanalista Donald Winnicott, os nossos filhos precisam que sejamos “suficientemente bons” no lugar de pais perfeccionistas e com expectativas demasiado elevadas e irrealistas. Acima de tudo pretende-se que, através do afeto, promovamos sentimentos de confiança, segurança e estrutura, para que os nossos filhos aprendam a lidar com o risco, a imprevisibilidade e a incerteza, promovendo a sua resiliência.
Pode achar que este assunto é demasiado cedo para ser abordado, mas acredite, é agora que tudo toma forma, porque o facto de saber que o seu filho já é uma realidade a ser gerada dentro de si, irá constatar que estes temas ser-lhe-ão mais familiares e fontes de maior interesse.
Alertamos para o facto de a pressão social e pessoal poder afetar a sua autoestima e autoimagem ao exigir-lhe que se adeque às inúmeras e ambivalentes expectativas. Por esse facto, considera-se de suma importância a existência de suporte emocional, social e médico a todas as mulheres grávidas. À grávida deve ser dada a oportunidade de expressar livremente os seus sentimentos e preocupações, sem julgamento, com o garante de poder vivenciar uma experiência positiva de gravidez.
Papéis sociais
O desempenho de novos papéis sociais podem afetar as várias relações familiares. A sua relação com o seu parceiro e com a sua mãe, podendo até ocorrer uma aproximação com esta, pela partilha de um papel comum – de mãe. Também o seu parceiro ou futuro avô podem sentir medo, ou insegurança pelo “dever” patriarcal incutido pela sociedade, o que deve ser respeitado e tido em conta. Ao pensar nestes aspetos considerámos oportuno incluir, nos nossos programas de preparação para o parto, o pai, os avós e quem a família considerar importante ser envolvida na criação de uma rede de apoio, neste projeto de maternidade, que será de todos.
A individualidade e unicidade de viver a sua gravidez, deve ser respeitada. Como já deve ter sentido, este período é único e especial, por isso importa que se sinta apoiada nas suas diferentes experiências, expectativas e desafios, de forma única e especial também.
Saiba mais sobre o nosso Programa de Preparação para o Parto e Preparação para Avosidade, aqui…
Programa de cuidados pré-natal
A Direção-Geral de Saúde (DGS), o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a Organização Mundial de Saúde (OMS) são unânimes ao recomendarem que as mulheres grávidas devem ser acompanhadas por um médico ou enfermeiro durante todo o período de gravidez.
É importante que as grávidas façam exames pré-natais, como testes de gravidez, exames de sangue e ecografias, para garantirem a saúde tanto da mãe quanto do bebé (díade). É recomendado que as grávidas façam pelo menos seis consultas pré-natais, com a primeira consulta a ocorrer no primeiro trimestre de gravidez (se possível até às 12 semanas de gravidez).
EXAMES DO 1º TRIMESTRE
O teste de gravidez é o primeiro passo para confirmar a gravidez. Ele pode ser feito em casa com um teste de farmácia ou com um teste de sangue prescrito pelo médico e realizado num laboratório de análises. O teste de farmácia deteta a presença da hormona hCG (gonadotrofina coriónica humana) na urina, confirmando a gravidez. O teste de sangue, além de ser mais preciso quanto ao tempo de gravidez (que não invalida a confirmação ecográfica), pode detetar a gravidez mais cedo do que o teste de farmácia.
A Idade Gestacional cronológica é determinada a partir da data da última menstruação (DUM). Contudo, parte-se do pressuposto que se engravidou nesse dia, o que à partida não será verdade. Terá passado, pelo menos, uns dias em que a concentração de estrogénio e progesterona diminuíram e que contribuíram para a produção da hormona foliculoestimulante (FSH), responsável pelo desenvolvimento dos folículos nos ovários (oócito ou óvulo), que difere de mulher para mulher. Esta data será ajustada quando realizar a ecografia do 1.º trimestre.
Rastreio analítico
Os exames de sangue incluem:
- Hemograma completo: para avaliar a contagem de glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas.
- Tipagem AB0 e fator Rh-D: para determinar o tipo sanguíneo e o fator Rh da mãe, o que é importante para evitar problemas com o bebé e em futuras gravidezes da mulher.
- Glicémia em jejum: para avaliar o nível de açúcar no sangue materno e detetar possíveis casos de diabetes gestacional.
- Pesquisa de VDRL, serologia Rubéola (IgG e IgM), Toxoplasmose (IgG e IgM), Ac VIH 1 e 2 e AgHBs: caso sejam desconhecidas ou não fosse imune em consulta pré-concecional, assim como para detetar se essas doenças foram contraídas no momento da gravidez, que podem ser transmitidas para o bebé e causar-lhe sequelas.
- Pesquisa de marcadores tiroideos: para avaliar a função da tiróide que pode afetar o desenvolvimento do bebé e ser responsável pela perda gestacional ou parto prematuro.
- Urocultura com eventual TSA (teste de sensibilidade antibiótica ou antibiograma): que pode levar a aborto espontâneo ou parto prematuro.
Rastreio ecográfico
A ecografia é um exame que usa ondas sonoras de alta frequência para visualizar, em tempo real, as estruturas internas do organismo, que no caso da gravidez permite avaliar o desenvolvimento do bebé e detetar possíveis problemas de saúde, in-útero (na barriga da mãe).
- Ecografia do 1.º Trimestre: É um exame realizado entre a 11.ª e a 13.ª semana + 6 dias de gravidez, com a finalidade de confirmar a viabilidade fetal, determinar o número de fetos (bebés) e nº de placentas (no caso da gravidez ser gemelar), datar corretamente a gravidez (através da avaliação do comprimento crânio-caudal – da cabeça do bebé às suas nádegas), diagnosticar malformações major e contribuir para a avaliação do risco de aneuploidias (anomalias cromossómicas).
- Rastreio combinado: consiste na combinação do rastreio ecográfico (ecografia do 1.º trimestre), com o rastreio bioquímico, obtido através da colheita de sangue da grávida (determinação da fração livre da b-hCG e da proteína A plasmática associada à gravidez – PAPP-A) e a análise de dados da história clínica da mesma (ex. idade materna, raça, hábitos tabágicos, doenças, gravidez através de técnicas de reprodução assistida, alterações cromossómicas numa gravidez anterior, etc.).
Idade gestacional definitiva: Nesta ecografia irá ser determinada a data gestacional mais aproximada, substituindo a data da última menstruação (idade gestacional cronológica).
É importante lembrar que os exames pré-natais são apenas uma parte do acompanhamento da gravidez sendo importante seguir as recomendações do médico ou enfermeiro, além de manter uma boa comunicação com estes para garantir a sua saúde e do seu bebé. A consulta (a realizar a cada 4-6 semanas até às 30 semanas de gravidez), além de ser um momento de avaliação de exames, deverá ser sobretudo um momento de esclarecimento de dúvidas, partilha de informação individualizada e adequada ao período da gravidez em que se encontra, sem descurar da antecipação de eventuais desafios, preocupações e características normativas ou não normativas da evolução da própria gravidez para que desta forma possa evitar stresses desnecessários.
Hábitos salutares
Hábitos devem ser reavaliados para melhores desfechos materno-fetais. São exemplo o consumo de álcool e tabaco, pois podem causar problemas de saúde no seu bebé. É recomendado, também, que evite o uso de medicamentos sem orientação médica, pelos riscos que estes possam ter sobre o bebé. Saiba neste link os efeitos dos medicamentos que toma ou que lhe são prescritos, sobre o seu bebé, durante a gravidez e enquanto amamentar.
A alimentação também é importante durante a gravidez. É recomendado que consuma uma dieta equilibrada, rica em vitaminas e minerais, e evite alimentos que possam conter bactérias, como carne ou ovos crus. Aconselhamos a leitura deste documento com 10 recomendações para uma alimentação saudável e segura na gravidez tendo especial atenção ao ponto 10 que aborda regras de segurança alimentar fundamentais para manter uma gravidez saudável. Relembramos a importância de manter a suplementação de 400 mg/dia de ácido fólico (pelo menos durante as 12 primeiras semanas de gestação), a ingestão adequada de iodo em alimentos que são fontes de iodo ou através de suplementação (não consensual pela comunidade médica e contraindicada quando a grávida tem patologia da tiróide) e suplementação em ferro como forma de prevenir a anemia materna e o baixo peso fetal à nascença.
É importante que se mantenha ativa durante a gravidez como forma de melhorar o tónus muscular, a resistência e a postura de forma a reduzir os edemas, aliviar as dores nas costas (lombalgias) e a obstipação (prisão de ventre). São recomendadas as práticas desportivas como a natação, caminhadas, yoga e exercícios aeróbicos de baixo impacto. Mas evite exercícios de alto impacto, atividades que possam causar lesões ou desporto de contato físico, ou que envolva risco de trauma abdominal. Fale com o seu médico ou enfermeiro sobre as suas práticas de exercício para que juntos reavaliem os seus efeitos sobre o bebé.
Conheça os sinais de alerta, como dor abdominal/pélvica, sangramento vaginal, corrimento vaginal com prurido (comichão)/ardor, vómitos persistentes, dores de cabeça fortes ou contínuas ou alterações extremas da tensão arterial (muito baixa ou elevada). No caso de estas ocorrerem procure ajuda médica, durante qualquer fase da gravidez.
Direitos parentais
É importante que as grávidas estejam conscientes dos seus direitos no trabalho, pois existem leis que protegem os pais e as mães na sua insubstituível ação em relação aos seus filhos. O artigo 68º da Constituição da República Portuguesa determina que as mulheres têm direito a especial atenção durante a gravidez e o parto, tendo direito a dispensa do trabalho por período adequado, sem perda de retribuição ou de quaisquer regalias. Saiba ainda que a legislação laboral pretende facilitar a conciliação da vida profissional com a vida familiar e promover a igualdade de direitos entre o pai e a mãe, fomentando a partilha da licença parental. Abordaremos este tópico num artigo diferenciado.
As recomendações para dar início a programas de preparação para o parto sugerem um intervalo temporal preferencial entre as 24 e as 28 semanas de gestação, de preferência após a realização da ecografia morfológica (entre as 20 e as 22 semanas + 6 dias). Embora sem validade científica, e opinando pessoalmente sobre esta questão, acredito que se não começou a preparar-se para o parto e transição para a parentalidade ainda antes de engravidar, o deva fazer assim que souber que gera dentro de si um bebé.
- DGS. Programa Nacional para a Vigilância da Gravidez de Baixo Risco. Lisboa2015.
- Nené M, Marques R, Batista MA. Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica. Lidel, editor. Lousã2016.
- Restantes referências direcionadas para a página ou documento próprio.