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Primeiro gostaria de salientar que esta é a minha visão sobre o tema e em nada se baseia, ainda, na evidência científica.

Desde o bug do milénio, ano 2000, que nos vimos a deparar com uma doença social à qual denominei por “aparenciosfera”. Esta trata-se de uma dependência de validação externa, na qual a aparência passou a valer mais que a essência, à qual se juntou a velocidade alucinante da internet a partilhar aquilo que se deseja transparecer, sob a recompensa de um like.

Deixe-me tranquiliza-la(o) que a culpa não é sua…

Tem outro nome e chama-se dopamina

Para quem não sabe, esta é conhecida como o “neurotransmissor da recompensa”, e está associada ao prazer, à motivação e ao reforço de comportamentos que nos proporcionam satisfação, resultando num ciclo de recompensa:

Experiência positiva – sensação de prazer – repetição do comportamento.

Por acaso já imagina onde desejo chegar?

Pois bem… a internet, mais concretamente, as redes sociais utilizam o ciclo de recompensa da dopamina para manter os usuários atraídos e aumentar o seu tempo de utilização.

Vídeos e posts com crianças e animais são aqueles que mais nos fascinam, pela sua espontaneidade e alegria genuína, no qual somos abençoados pela libertação, não só de dopamina como de ocitocina, a conhecida “hormona do amor”.

Quando interagimos de forma afetuosa com outras pessoas, como em abraços ou demonstrações de carinho, a ocitocina é libertada, fortalecendo os laços sociais e aumentando a confiança. Simultaneamente, o mesmo ocorre com a dopamina que irá proporcionar uma sensação de prazer e bem-estar. Este mecanismo dual ajuda a promover e reforçar interações sociais saudáveis e recompensadoras, através do reforço de comportamentos sociais positivos.

O seu cérebro é facilmente enganado, pela internet

Através desta interação

Esta é a estratégia utilizada, pela grande maioria de nós, quando partilhamos com os outros os momentos captados daqueles que mais amamos, nomeadamente, os nossos filhos e animais.

Hoje em dia há, inclusivamente, quem ganhe dinheiro com a imagem dos próprios filhos, por exemplo através daqueles vídeos amorosos com crianças no Youtube, ou aumento de visualizações e seguidores no Instagram, TikTok e Facebook.

Trabalhos têm sido desenvolvidos para colmatar esta exploração da imagem infantil. Veja-se que a própria UNICEF incluiu esta exploração como um dos critérios a ter em conta para proteger as crianças em todo o mundo. Inclusivamente, a própria Dove, através da sua posição social a nível mundial, ilustrou de uma forma extraordinária o impacto que estas atitudes parentais, na grande maioria inocentes, podem contribuir negativamente para o desenvolvimento e crescimento das nossas crianças e adolescentes de hoje.



Hoje em dia é você a “utilizar”, de forma não autorizada, a imagem do seu filho, na esperança de uma libertação interna de dopamina e ocitocina pelo aumento de comentários, visualizações e seguidores. Amanhã será o seu filho a viver dessa mesma forma.

Pergunto-lhe: você está preparado para o ver partilhar todas as fotografias, vídeos e parte da sua vida com o mundo? Acha que ele está preparado para saber o que, quando e como poderá fazer essa partilha?

Que informação lhe passa quando partilha com o mundo uma fotografia ou vídeo do seu filho, resultante de alguma discórdia porque este não estaria a colaborar com a pose ou com as frases predefinidas, e após alguma tecnologia o resultado se torna perfeito contrastando com a realidade?!


“A construção das identidades, virtuais ou não, ocorre no espaço
do simbólico. Toda concepção identitária se esboça em forma de representação e no caso das redes virtuais de relacionamento, a representação
do indivíduo se dá por meio da publicização* do eu. O ego se torna uma
centralidade na rede. A forma de se projetar a imagem na rede pode
ser caracterizada como dramática, na medida em que é uma espécie de
processo teatral de representação.”

Mario Vargas Llosa, 2013

*Acção de fazer com algo se torne público.

Deixe-me contar-lhe uma história real, a minha. A última vez que fui a um hotel com os meus filhos, dei de caras com uma mãe a gritar com as filhas porque estas não paravam de saltar e brincar em vez de se colocar na posição que a mãe havia pensado para as poder fotografar. Ao fim de alguns berros, as meninas lá cederam e colaboraram com aquela fotografia que, talvez, venha a ser publicada na internet com a legenda “As melhores filhas do mundo” e #saotaotranquilas.

As melhores fotografias e vídeos jamais existirão

Como é que tenho a coragem de fazer esta afirmação?! Porque quando estamos a viver realmente, a divertir-nos verdadeiramente, a dar aquelas gargalhadas profundas que chegam a fazer chorar, NINGUÉM vai estar a filmar, a fotografar nem a registar. Essas memórias ficarão apenas na mente de cada um dos presentes.

Além disso, essas não são as expressões faciais que selecionaríamos para partilhar com o mundo, embora sejam essas que revelam a essência de cada um, a verdade e a realidade.

Você está disposta(o) a viver uma vida que não é a sua, a ser o que você não é, na esperança de viver as oportunidades que não são suas e uma realidade que não existe? E está disposta(o) para ver os seus filhos a seguirem essa mesma história? Não precisa responder… talvez só se aperceba quando o tempo tiver passado e quando já bem velhinha(o) olhar para trás e se aperceber que as únicas histórias que tem para contar nenhuma é a sua.

Hoje é o dia para SER, VIVER, ABRAÇAR e TOCAR… são estes comportamentos que irão ajudá-la(o) a escrever aquela história que você adorará contar no final da sua vida.

Qual a história que você está a escrever hoje? Ainda vai a tempo de virar esta página.

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